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Quem são os Lobos Cinzentos, organização extremista turca banida em vários países

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Os Lobos Cinzentos, um movimento político turco de direita radical, ganha atenção no mundo, assim como o gesto símbolo do grupo, uma cabeça de lobo. O que torna o grupo tão polêmico? A ‘saudação do lobo’ é o símbolo dos Lobos Cinzentos e representa a cabeça de um lobo: o indicador e o mindinho formam as orelhas, o polegar, o dedo médio e o anelar formam o nariz e a boca
Getty Images/Via BBC
Os Lobos Cinzentos, um movimento político turco de direita radical, recebe cada vez mais atenção no mundo todo, assim como o gesto que o representa, que forma uma cabeça de lobo.
A “saudação do lobo” provocou, recentemente, forte polêmica no campeonato de futebol Euro 2024, quando o jogador turco Merih Demiral fez o gesto após marcar um gol na partida da Turquia contra a Áustria, vencida por seu time por 2 a 1.
“Os símbolos dos extremistas de direita turcos não têm lugar em nossos estádios”, disse a ministra do Interior da Alemanha, Nancy Faeser, em um post no X. Demiral foi posteriormente suspenso pela UEFA por duas partidas.
A Turquia reagiu acusando Berlim de “xenofobia” pelas críticas à saudação do lobo, e o presidente turco Recep Tayyip Erdogan saiu em defesa de Demiral, dizendo:
“Alguém pergunta por que a camisa nacional alemã tem uma águia ou a camisa francesa tem um galo? Merih (Demiral) mostrou sua emoção com esse gesto.”
O jogador turco Merih Demiral causou polêmica ao fazer a saudação do lobo na Euro 2024
Getty Images/Via BBC
Para muitos, a saudação do lobo está diretamente associada à organização Lobos Cinzentos, também conhecida pelo nome de Idealist Hearths. É a ala jovem ultranacionalista do Partido do Movimento Nacionalista (MHP) na Turquia, aliado do AKP, partido de Erdogan.
Nem a saudação do lobo, nem a organização Lobos Cinzentos são proibidas na Alemanha. Áustria e França tomaram medidas mais duras: a primeira proibiu o gesto e a última proibiu todas as atividades da organização.
‘Um grupo extremista de direita’
“Quando falamos do movimento Lobos Cinzentos na Alemanha estamos falando de um ecossistema mais amplo de clubes, de cafés, de associações locais de bairro”, diz Burcu Ozcelik, pesquisador sênior de Segurança do Oriente Médio no Royal United Services Institute (RUSI), um think tank do Reino Unido.
Ela destaca que existem vários graus de associação com os Lobos Cinzentos na Alemanha – de apego, filiação ou comprometimento com o grupo – e eles são, em sua maioria, fluidos.
O escritório federal alemão para a proteção da constituição (BfV, na sigla em alemão) classifica os Lobos Cinzentos como um grupo extremista de direita com 18.500 a 20.000 membros no país.
Os turcos constituem a maior minoria étnica na Alemanha, com cerca de 3 milhões de cidadãos turcos e cidadãos alemães de ascendência turca. A Alemanha tem uma população de 84 milhões.
A Áustria proibiu o uso da saudação do lobo em 2019, e a França proibiu todas as atividades dos Lobos Cinzentos em 2020
Getty Images/Via BBC
“Entre a maioria da diáspora turca na Europa, tendências e símbolos nacionalistas são bastante fortes”, diz o jornalista Kemal Can, especialista em nacionalismo na Turquia.
“Os islamistas e nacionalistas na Europa são organizados. Então os governos europeus estão geralmente preocupados que essas organizações políticas, ou estruturas criminosas, possam ter o potencial de causar tensão”, diz.
“Eles querem introduzir mecanismos para restringir não apenas seus próprios grupos extremistas de direita, mas também aqueles dentro das comunidades migrantes.”
Ação violenta
Os Lobos Cinzentos são acusados ​​de vários atos de violência na Turquia e na Europa desde a década de 1970.
Em 1983, o Papa João Paulo 2º conversou com Mehmet Ali Agca na prisão. Em 1981, o líder da igreja católica foi alvo de uma tentativa de assassinato orquestrada por Agca, integrante dos Lobos Cinzentos
Getty Images/Via BBC
Um dos casos de maior destaque envolvendo a organização foi a tentativa de assassinato do Papa João Paulo 2º, em 1981, por Mehmet Ali Agca, integrante dos Lobos Cinzentos. O chefe da igreja católica foi baleado e ferido no ataque.
O grupo também se envolveu em confrontos de rua na Turquia nas décadas de 1970 e 1980, quando seus membros participaram de guerrilhas urbanas com militantes de esquerda.
Acredita-se que os Lobos Cinzentos tenham ligações com o “estado profundo turco”, uma suposta rede de coalizões poderosas e antidemocráticas dentro das estruturas políticas e burocráticas turcas.
Também houve vários confrontos de rua envolvendo os Lobos Cinzentos em cidades europeias nos últimos anos.
O analista político Burcu Ozcelik diz que esses incidentes criaram um ambiente de medo, levantando um debate mais amplo sobre como lidar com o grupo.
Na Alemanha, embora controversos, os Lobos Cinzentos não são um grupo ilegal. Mas a Áustria proibiu o uso do gesto do lobo em 2019, e a França proibiu todas as atividades dos Lobos Cinzentos em 2020.
Em 2021, o Parlamento Europeu aconselhou adicionar os Lobos Cinzentos à lista de terroristas da União Europeia.
A polêmica em torno da organização vai além das fronteiras da Europa.
No Azerbaijão, um país com laços históricos e linguísticos próximos à Turquia, o grupo tentou capitalizar o fortalecimento do nacionalismo após o colapso da União Soviética em 1991.
“Os Lobos Cinzentos tornaram-se polêmicos no Azerbaijão após seu suposto envolvimento em uma tentativa de golpe fracassada em 1995 contra Heydar Aliyev, o pai do atual presidente, Ilham Aliyev”, diz Könül Khalilova, editora da BBC News Azerbaijani.
“Heydar Aliyev, um ex-general da KGB, via o grupo como uma ameaça ao seu regime. Como resultado, os Lobos Cinzentos foram banidos do Azerbaijão, e seu líder foi morto durante a tentativa de golpe.”
Em 2005, o Cazaquistão, um país da Ásia Central, também com múltiplas conexões históricas com a Turquia pela língua e cultura, também declarou a organização ilegal, classificando-a como um “grupo terrorista”.
A Turquia diz que não há um movimento chamado Lobos Cinzentos e que a proibição da saudação do lobo é inaceitável.
O lobo como figura orientadora
“O símbolo do lobo é um dos símbolos mais importantes dos turcos”, disse Ahmet Tasagil, professor do Departamento de Língua e Literatura Turca da Universidade Yeditepe de Istambul à agência de notícias Anadolu.
“Todas as tribos turcas que viviam na Ásia Central usaram o símbolo durante os séculos 4 e 5”, disse.
Ele também apontou para as fontes dos séculos 12 e 13 que mencionam que os turcos, ao chegarem à Anatólia, seguiram um lobo, de acordo com lendas armênias, siríacas, entre outras do Oriente Médio.
“Para os turcos, o lobo é uma figura orientadora, que representa sabedoria”, disse ele.
Durante o período otomano, no final do século 19, o símbolo do lobo foi usado de várias formas, e nos primeiros anos da Turquia moderna ele apareceu em notas e selos.
A saudação do lobo em si é muito mais recente. Ela surgiu no Azerbaijão durante o início dos anos 1990, em meio a protestos em massa, diz Könül Khalilova.
“Esses protestos contribuíram para a independência do país e para o colapso da União Soviética. Esse gesto, mesmo que não seja amplamente usado, tornou-se um símbolo da identidade turca para algumas pessoas”, diz ela.
“Para elas, simbolizava a identidade cultural e étnica que havia sido suprimida durante o regime soviético”, explica.
Acredita-se que o fundador do Partido do Movimento Nacionalista na Turquia testemunhou o uso da saudação do lobo durante um comício no Azerbaijão em 1992 e adotou-a como um símbolo para os Lobos Cinzentos na Turquia.
‘Não é um símbolo nacional’
“Na década de 1990, os Lobos Cinzentos estavam na onda geral do sentimento nacionalista e tinham uma identidade que se declarava sobre a exclusão da minoria curda”, diz o especialista em nacionalismo Kemal Can.
Ele enfatiza que, na Turquia, muitos líderes políticos dos diferentes espectros usaram a saudação do lobo para se mostrarem simpáticos aos eleitores nacionalistas.
“No entanto, essa saudação nunca foi aceita como um símbolo nacional na Turquia”, diz.
Burcu Ozcelik concorda.
“Muitos turcos, embora muito abertos sobre seu sentimento e identidade nacionalista turcos, e muito orgulhosos disso, não se associam aos Lobos Cinzentos”, ela diz.
“Portanto, não é um símbolo unificador, nem representa um senso universal mais amplo de ser turco.”

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Com discurso contra imigração, extrema direita faz campanha na Alemanha usando 'santinho' em forma de bilhete de deportação

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Polícia abriu investigação para apurar incitação ao ódio. AfD, que aparece em segundo lugar nas pesquisas, confirmou distribuição dos folhetos. AfD distribuiu folhetos em formato de passagem aérea sinalizando deportação de imigrantes
Reprodução/X
A polícia alemã anunciou que abriu uma investigação após o partido de extrema direita AfD distribuir folhetos de campanha em forma de “bilhetes de deportação” para imigrantes, no âmbito da campanha para as eleições legislativas de fevereiro. Os folhetos imitam passagens aéreas.
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A investigação foi aberta após “suspeitas de incitação ao ódio”, disse um porta-voz policial da cidade de Karlsruhe, no oeste da Alemanha, onde os folhetos foram distribuídos.
A seção do Alternativa para a Alemanha (AfD) em Karlsruhe confirmou em seu site a criação do “bilhete de deportação”.
No documento vem escrito “passagem de ida em classe econômica” para um “imigrante ilegal” saindo da Alemanha com destino a um “país de origem seguro”.
O embarque ocorre na porta “AfD” no dia 23 de fevereiro, data das eleições, das “8h às 18h”, horário de funcionamento das seções eleitorais.
No verso do bilhete, a AfD defende, entre outras coisas, a “expulsão de todas as pessoas obrigadas a deixar o território” alemão.
O folheto oferece à AfD “a oportunidade de comunicar aos eleitores essas demandas completamente legítimas e de acordo com a lei de uma maneira simplificada”, justificou a seção local.
Esse material de propaganda eleitoral “está sendo distribuído atualmente em Karlsruhe da maior forma possível e sem requisitos ou restrições particulares”, acrescentou.
Algumas pessoas viram no horário de fechamento, 18h, um código neonazista baseado nas iniciais de Adolf Hitler, já que A e H são as letras 1 e 8 do alfabeto (1=A e 8=H). A seção local do partido rejeitou as acusações.
Um usuário da rede social X que se apresenta como “cidadão alemão de origem turca” afirmou que recebeu o folheto em sua caixa de correio e que teve um “sentimento muito estranho”.
“Meu sobrenome provavelmente foi determinante para essa ação”, acrescentou.
O partido de esquerda radical Die Linke qualificou a iniciativa de “método fascista para incitar o ódio” e acusou a AfD de se dirigir a pessoas de origem imigrante.
As pesquisas colocam o partido de extrema direita na segunda colocação para o pleito de fevereiro.
A AfD incluiu em seu programa eleitoral a polêmica noção de “remigração”, que prevê a realização de campanhas de expulsão de estrangeiros.
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Cachorra 'superdotada'? A border collie brasileira que sabe 200 palavras e virou estrela de pesquisa

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Uma border collie de 6 anos, Gaia faz parte de um pequeno grupo internacional de cachorros com uma habilidade excepcional para aprender palavras. Gaia tem mais de 200 brinquedos e sabe o nome de cada um deles
Arquivo pessoal
Quem entra no apartamento dos brasileiros Isabella Ruiz e Raphael Ballet, em Londres, vê logo uma cesta repleta de brinquedos.
São da Gaia, uma border collie de 6 anos que também emigrou do Brasil para o Reino Unido.
A quantidade de brinquedos — 215 quando esta reportagem foi escrita — chama atenção, mas o que impressiona mesmo é que Gaia conhece cada um deles pelo nome.
Ela tem um dom raro. Gaia faz parte de um pequeno grupo, apelidado por pesquisadores de “cães gênios”, com um talento excepcional para aprender nomes de objetos — uma habilidade cognitiva que separa seres humanos de outros animais.
Até agora, apenas 41 cachorros no mundo foram identificados com essa habilidade, segundo um grupo de pesquisa da Universidade Eötvös Loránd, em Budapeste (Hungria).
Isso não é a mesma coisa que aprender comandos relacionados a ações, como pedidos para sentar ou deitar, por exemplo, como ocorre no adestramento, explicam os pesquisadores.
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Gaia é capaz de buscar os brinquedos em outros cômodos, um a um, quando um adulto pede, sem dicas gestuais dos humanos.
E tem mais: o que mais impressionou Isabella, Raphael, os pesquisadores e a equipe da BBC News Brasil foi a capacidade de selecionar o brinquedo solicitado por um processo de exclusão.
Quer dizer, se você colocar um novo brinquedo (cujo nome ela ainda não conhece) entre os objetos já conhecidos, Gaia é capaz de buscá-lo após ser pedido pelo nome que ela nunca tinha ouvido antes.
Essas habilidades foram testadas e relatadas pelos pesquisadores nos últimos anos — e a BBC News Brasil foi ver de perto.
A seguir, conheça a trajetória de Gaia, como ela foi descoberta por um grupo de pesquisa na Europa, e o que os estudos sobre o tema conseguem explicar sobre esse talento até agora.
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‘Filhote com muita energia’
Gaia chegou à casa de Isabella e Raphael com dois meses e muita disposição para brincar, contam eles.
“Era um filhote com muita energia, e isso deixou a gente um pouco assustado”, lembra Isabella.
Na época, o casal morava em São Paulo e decidiu buscar ajuda de uma adestradora para criar uma rotina de atividades para Gaia, que incluía brincadeiras de esconder objetos para a cachorra encontrar.
Com menos de um ano, Gaia sabia identificar os nomes de três brinquedos, o que chamou a atenção da adestradora Carolina Jardim, que tem 15 anos de experiência na área.
“Até mesmo para um border collie, que é uma raça com muita disposição para aprender, ela mostrou uma facilidade fora do comum de memória”, diz Carolina, que também é mestranda em Psicologia Experimental na Universidade de São Paulo (USP).
Apesar de ter se surpreendido, naquele momento a adestradora ainda não sabia que Gaia tinha uma habilidade tão rara.
Mas o desempenho de Gaia foi marcante.
Em março de 2020, quando Gaia tinha cerca de 2 anos, Carolina soube do estudo em que pesquisadores estrangeiros buscavam cachorros com um talento fora do comum para identificar nome de brinquedos.
“Quando eu soube da pesquisa, na hora lembrei da Gaia e falei com os tutores: é a cara de vocês, acho que a Gaia tem potencial”, conta à BBC News Brasil.
Isabella e Raphael entraram em contato com o grupo de pesquisadores do departamento de Etologia da universidade de Eötvös Loránd, na Hungria, que pediu ao casal para fazer um teste caseiro com a Gaia.
Para integrar a pesquisa, era necessário que a cachorra soubesse um número mínimo de brinquedos, e em condições controladas, sem interferência de Isabella, de Raphael ou de adestradores.
Era uma regra, por exemplo, que os brinquedos deveriam ser colocados fora do campo de visão dos humanos e de Gaia.
O resultado surpreendeu Isabella e o marido.
“A gente colocou uns 20 brinquedos no corredor de casa e foi pedindo para ela buscar. E ela foi trazendo, um por um. A gente ficou muito impressionado que ela sabia tantos nomes, porque a gente nunca tentou ensinar”, conta.
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Raphael, Gaia e Isabella durante viagem para Edimburgo, na Escócia
Arquivo pessoal
No mesmo ano, a pesquisadora Claudia Fugazza, PhD em Etologia que lidera o projeto, visitou Gaia no Brasil para realizar alguns testes pessoalmente.
Além do teste padrão, Fugazza desafiou Gaia a encontrar os brinquedos no escuro e a identificar brinquedos cujo nome ela nunca tinha escutado.
Fugazza disse que, por mais que pesquisasse esse talento em cachorros e já tivesse conhecido naquele momento outros dois cães com essa habilidade, ela ficou impressionada com Gaia.
“Foi incrível vê-la em ação e o quão rápido ela aprendia. Fiquei particularmente surpresa quando vi como ela excluía objetos que já conhecia ao ouvir o nome de um brinquedo desconhecido”, conta.
Brinquedo novo
A seleção de brinquedos por meio do processo de exclusão também surpreendeu a equipe da BBC News Brasil, que reproduziu o experimento quando visitou o apartamento de Isabella e Raphael.
Para fazer o teste, a BBC levou um brinquedo que Gaia não conhecia e deu o nome de “pirulito”.
Sem que Gaia visse, o objeto foi colocado no meio de outros 10 brinquedos conhecidos por ela, em um corredor do apartamento.
Da sala, Isabella pediu, primeiro, que Gaia pegasse um brinquedo que ela já conhecia — para eliminar a possibilidade de Gaia ir diretamente no objeto desconhecido simplesmente por ser uma novidade.
Em seguida, ela pediu para Gaia pegar o “pirulito” — brinquedo que a cachorra nunca tinha visto ou escutado o nome.
Ao ouvir a nova palavra, Gaia foi até o cômodo ao lado e voltou com o pirulito, o brinquedo novo.
“É uma habilidade cognitiva impressionante porque os seres humanos também fazem isso. Se você colocar vários objetos juntos e pedir a uma criança para pegar um objeto cujo nome ela nunca ouviu antes, ela é capaz de raciocinar por exclusão e pegar o objeto novo”, explica Fugazza à BBC News Brasil.
“Eles inferem que, como aquele brinquedo novo é o único desconhecido, e os outros têm um nome que eles já conhecem, o novo é aquele ao qual você está se referindo.”
Gaia conseguiu identificar o brinquedo novo, chamado de pirulito, por um processo de exclusão
João da Mata/BBC
Memória por dois anos
Quando a pesquisa começou, em 2018, Fugazza diz que o objetivo era estudar como os cães entendiam o que os seres humanos falavam.
Segundo ela, o grupo não sabia que existiam animais capazes de reconhecer palavras de objetos — até conhecer um cachorro que já possuía essa habilidade linguística.
“Aquilo me intrigou muito, porque a linguagem por meio de palavras é uma característica do ser humano. Mas a gente pensou: se tem um, pode ter mais. E começamos a procurar.”
Gaia entrou oficialmente para a pesquisa em 2020 e foi a primeira cachorra brasileira a ser identificada como gifted word learner dog (em português, um cachorro com talento de aprender palavras).
Até então, havia cinco cachorros de outros países já certificados com esse talento.
Naquele momento, segundo Fugazza, os pesquisadores tinham uma dificuldade muito grande em tornar o estudo conhecido e encontrar mais cachorros com essa habilidade.
Então, durante a pandemia, eles criaram um desafio internacional de cães gênios, com a participação dos seis cachorros, incluindo a Gaia.
A brincadeira consistia em duas fases: na primeira, os cachorros tinham que aprender 6 objetos em uma semana.
Na segunda fase, eram 12 brinquedos em uma semana.
A disputa foi transmitida ao vivo pelo canal do YouTube “Genius Dog Challenge”.
Gaia gabaritou nos dois desafios, acertando todos os objetos.
Gaia é certificada por universidade em Budapeste como uma cachorra com talento para aprender palavras
João da Mata/BBC
O mais surpreendente, contudo, de acordo com a pesquisadora, foi perceber que, dois anos após o desafio, os cachorros ainda lembravam do nome de objetos com os quais perderam o contato.
“Pedimos aos donos de cachorros para esconder os brinquedos por dois anos para fazer um teste de memória. E ficamos impressionados em ver que a maioria dos cachorros lembrava de uma grande parte dos objetos”, conta.
Quando esse teste de memória foi feito com Gaia, ela lembrou de nove de 12 brinquedos.
Como ensinar palavras a um cachorro?
A pergunta que Isabella e Raphael mais recebem nas redes sociais, em um perfil onde compartilham a rotina da Gaia, é: Como eles ensinaram o nome dos brinquedos?
“A gente não ensinou, ela aprendeu brincando”, diz Isabella.
Estudos realizados pela Universidade de Eötvös Loránd indicam que, segundo o que se sabe até agora, a habilidade de aprender palavras não pode ser ensinada. O que é possível é que um cachorro que já tem essa habilidade aprenda novas palavras.
“No início da pesquisa, eu estava convencida de que era possível ensinar ao menos alguns nomes. Mas falhamos em todas as vezes que tentamos”, afirma Fugazza.
Em um dos experimentos, o grupo de pesquisadores selecionou 39 cachorros de diferentes raças (19 adultos e 15 filhotes) para ensinar nomes de brinquedos.
Eles passaram dois meses com sessões de brincadeiras que envolviam esses objetos, reproduzindo o que os donos de cachorros com essas habilidades contaram que faziam.
No fim do período, apenas um cachorro havia aprendido o nome de brinquedos.
“Parece ser um dom, que ou o cachorro tem ou não”, diz a pesquisadora.
Por que alguns cachorros conseguem e outros não?
Uma das questões que mais intriga os pesquisadores — e o público — é: por que alguns cachorros têm essa habilidade e outros não?
“A gente ainda não tem essa resposta. Pode estar associado a um conjunto de fatores. Pode ser um fator genético, pode ser do ambiente em que eles vivem, ou pode ter relação a uma exposição desde muito novos a várias palavras enquanto brincavam. Essas são algumas hipóteses”, diz Fugazza.
“A única coisa que a gente sabe é que eles não aprenderam de forma sistemática, por meio de treinamento, mas de forma espontânea”.
A pesquisadora diz que a maioria dos donos de cachorros que participam do projeto são como Isabella e Raphael: pessoas comuns, com uma “vida normal”, sem especialização em técnicas de adestramento.
“No geral, eles não sabem dizer como os cachorros aprenderam as palavras, porque eles nunca tiveram a intenção de ensinar. Mas a percepção deles é que os cachorros têm muito mais disposição para brincar do que outros cachorros”, afirma.
Apesar de mais da metade dos cachorros da pesquisa serem border collies — dos 41 cachorros, 23 são desta raça — Fugazza lembra que a maioria dos border collies não têm essa habilidade de aprender palavras
“Eu tenho um border collie e ele não sabe nenhuma palavra”, diz, rindo. “Além disso, há cachorros de outras raças na pesquisa, como shitzu, além de vira-latas”.
Além dos 23 border collies entre os 41 cães identificados pela pesquisa, há também outros quatro cachorros que são misturas com border collie, três labradores, dois lulu-da-pomerânia, além de nove cachorros de outras raças ou vira-lata.
Os cachorros foram encontrados em 9 países: Estados Unidos, Reino Unido, Brasil, Canadá, Noruega, Hungria, Holanda, Portugal e Espanha.
É adestramento?
Fugazza destaca que a habilidade dos cães para aprender palavras é diferente da capacidade de aprender comandos e ações, o que a maioria dos cachorros consegue aprender por meio de treinamento.
“Para aprender nomes de ações, os cães usam os princípios de aprendizagem por condicionamento, formando associações. Na presença de um determinado estímulo, como o som de ‘senta’ ou ‘deita’, eles produzem um comportamento específico, que gera uma recompensa. Esse é um mecanismo de aprendizagem amplamente difundido e que não está relacionado à linguagem”, explica.
“Já no aprendizado de palavras, estamos falando de uma habilidade cognitiva de linguística, algo que pertence à espécie humana, mas que esses animais, de alguma forma, aprenderam em atividades do dia a dia, brincando.”
Ainda não se sabe quais mecanismos esses cachorros usam no processo de aprendizagem e se, de alguma forma, se assemelham ao usado por crianças para aprender palavras.
No entanto, segundo Fugazza, os estudos realizados indicam que os cães usam diversos sentidos para reconhecer os objetos.
“Em experimentos que fizemos no escuro, observamos que eles são mais devagar para pegar objetos, o que indica que eles usam principalmente a visão. Mas foi interessante ver que, na ausência de luz, durante as buscas por brinquedos, eles usam outras habilidades sensoriais como olfato e tato”, destaca.
À BBC News Brasil, Claudia Fugazza diz que os pesquisadores ainda buscam entender o que explica a rara aptidão de alguns cachorros de aprender o nome de objetos
João da Mata/BBC
Como saber se meu cachorro é ‘superdotado’?
Se um cachorro sabe os nomes de três ou quatro objetos, é possível que ele seja “superdotado” e consiga aprender novas palavras quando exposto a outros brinquedos, segundo Fugazza.
“Até onde a gente sabe, se um cachorro sabe três ou quatro nomes, é fácil para ele conseguir ampliar seu vocabulário para 50 ou 100. O mínimo para fazer o teste são dois”, afirma.
Esse número pode parecer pouco, mas a pesquisadora explica que, por mais esperto que um cachorro seja, poucos são realmente capazes de desenvolver habilidades de linguagem.
“Muitos donos pensam que seus cachorros sabem os nomes de objetos porque eles são muito bons em ler nossa linguagem corporal. Mas, quando você pede a um cachorro para pegar uma bola, você normalmente está dando uma dica visual ou fazendo uma movimentação com o seu corpo que indica o que você quer ou onde o objeto está. Então, o cachorro pega a bola não porque ele sabe a palavra, mas diante do contexto”, afirma Fugazza.
Por isso, para verificar se um cachorro tem ou não uma habilidade relacionada à linguagem, os pesquisadores realizam testes em condições controladas, em que o cachorro precisa identificar os objetos sem qualquer tipo de dica, como foi feito com a Gaia.
“A gente coloca vários brinquedos espalhados em um cômodo diferente daquele que o tutor e o cachorro estão. Assim, quando o tutor pede para que o cachorro busque um determinado brinquedo, ele não tem como ajudar por meio de um contato visual que direcione o cachorro. O cachorro precisa ir até o outro cômodo sozinho e resolver esse problema, apoiando-se puramente na palavra que ouviu”, explica a pesquisadora.
Gaia foi a primeira cachorra brasileira a fazer parte da pesquisa que investiga a habilidade de cachorros para aprender nomes de objetos
João da Mata/BBC
Quantas palavras um cachorro ‘superdotado’ consegue aprender?
O número de palavras que um cão pode aprender varia, dizem os pesquisadores.
Os cachorros identificados pela universidade em Budapeste sabem entre 200 e 400 nomes de brinquedos. Mas há registros na literatura de um cachorro que aprendeu mais de mil palavras.
“Quanto mais brinquedos ele tiver, mais nomes ele vai saber. A gente não sabe se existe um limite”, afirma Fugazza.
“Os estudos mostram que eles precisam ouvir apenas quatro vezes o nome de um novo objeto para aprendê-lo. E isso leva questões de minutos, o que é impressionante.”
Embora apenas 41 cachorros com essa habilidade tenham sido encontrados ao redor do mundo, os pesquisadores acreditam que existem mais e divulgam informações na página do projeto.
“Temos pouco acesso a países cuja língua oficial não seja o inglês, e a gente acredita que, por isso, existam muitos cachorros com essa habilidade que ainda não foram descobertos”, diz Fugazza, ressaltando a contribuição desses cães para a ciência.
“Além de ser incrível ver as habilidades que esses cachorros têm, estudá-los pode nos ajudar a entender como a linguagem em seres humanos evoluiu.”
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Irã e Rússia anunciam acordo que inclui áreas de defesa e segurança

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O ‘Acordo Global de Associação Estratégica’ prevê “cooperação nas áreas de energia, meio ambiente e questões de defesa e segurança”, detalhou embaixada iraniana. Anúncio foi feito pelo Kremlin nesta segunda-feira (13). Vladimir Putin, presidente da Rússia
Reuters/Maxim Shemetov
A Rússia e o Irã assinarão um “Acordo Global de Associação Estratégica” na sexta-feira (17), durante a visita do presidente iraniano, Massoud Pezeshkian, à Rússia, anunciou o Kremlin nesta segunda-feira (13).
Rússia e Irã estão sob duras sanções ocidentais e estabeleceram laços estreitos em vários setores, inclusive o militar.
O acordo abrange “a cooperação econômica e comercial nas áreas de energia, meio ambiente e questões de defesa e segurança”, disse a embaixada iraniana na Rússia na semana passada via Telegram.
No ano passado, Moscou concluiu um tratado de mesmo nome com a Coreia do Norte. Um dos artigos do acordo, ratificado pelos deputados russos em outubro, prevê “assistência militar imediata” em caso de agressão armada por terceiros países.
As potências ocidentais veem isso como um risco de intensificação do conflito entre Rússia e Ucrânia, que começou há quase três anos.
Kiev e várias potências ocidentais acusam a Coreia do Norte de enviar soldados para lutar com o exército russo contra as forças ucranianas. Moscou e Pyongyang não confirmaram nem negaram essas acusações.
Masoud Pezeshkian, presidente do Irã
REUTERS/Mike Segar
O Ocidente também acusa Teerã de fornecer drones explosivos Shahed e mísseis de curto alcance para a Rússia. O Irã rejeita essas acusações.
Pezeshkian e Putin se encontraram pela última vez em outubro, durante a cúpula do Brics em Kazan, sudoeste da Rússia. Na ocasião, o presidente russo falou sobre uma visita iminente de seu colega iraniano para assinar este acordo de associação, segundo o Kremlin.
Em outubro, Putin elogiou os laços “amigáveis” entre Teerã e Moscou e pediu a consolidação da “dinâmica positiva” de sua cooperação econômica.
A Rússia quer desenvolver um corredor logístico, ferroviário e marítimo entre Moscou, Baku, capital do Azerbaijão, e Teerã.
Irã e Rússia também eram aliados do ex-presidente sírio Bashar al-Assad, que foi deposto em 8 de dezembro por uma coalizão de rebeldes dominada por islamistas.

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