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Humor ou capacitismo: Comitê Paralímpico Internacional viraliza com memes de atletas e divide opiniões
Conteúdos do Comitê Paralímpico Internacional (IPC) somam mais de 1 bilhão de visualizações somente no TikTok, mas Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) diz que alguns deles podem ser ofensivos. Atletas elogiam. Vídeo intitulado como “Beethoven” mostra atleta do paratriathlon dos EUA tateando o ar buscando sua bicicleta.
Reprodução/TikTok
“Não é possível que esta conta seja oficial”, “Eu vou para o inferno por rir disso?”, “Este é o melhor perfil que eu já vi na minha vida”.
Comentários como estes são recorrentes nas redes sociais do Comitê Paralímpico Internacional (IPC), que têm viralizado às vésperas das Paralimpíadas de Paris 2024 e ganhado a atenção dos brasileiros. Só no Tiktok, o perfil do IPC já reúne 4,3 milhões de seguidores e mais de 1,8 bilhão de visualizações.
O motivo para as reações dos usuários está na estratégia utilizada pelos perfis oficiais do @Paralympics: vídeos curtos, áudios virais e um humor, no mínimo, controverso. Isto porque alguns dos conteúdos transformam em memes erros, expressões, comemorações e outros momentos de atletas paralímpicos durante competições internacionais.
Em um dos vídeos, que soma mais de 23 milhões de visualizações, o atleta dos Estados Unidos Brad Snyder, que é cego, aparece tateando o ar em busca de sua bicicleta durante uma prova de paratriathlon, até que seu atleta-guia o ajuda a encontrá-la (veja no print acima). O vídeo de 11 segundos utiliza um áudio de uma música de piano, como se Snyder estivesse “tocando o instrumento”, e traz a legenda “Paratriathlon é natação, bicicleta e piano aéreo 🎹”.
A estratégia do IPC para viralizar nas redes sociais foi idealizada por Richard Fox, um ex-atleta paralímpico inglês que competiu no futebol de sete nas Olimpíadas de Pequim, em 2008, e hoje atua como coordenador de redes sociais no comitê.
De um lado, há quem diga que o modelo de Fox é inovador e dá visibilidade ao esporte paralímpico. De outro, quem afirme que os vídeos reproduzem práticas capacitistas contra pessoas com deficiência (PCDs).
O g1 conversou com atletas, entidades esportivas e uma especialista em diversidade para entender os diferentes pontos de vista sobre os virais (veja abaixo).
➡️ As críticas
Em nota enviada ao g1, o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) afirmou que o tipo de campanha promovido pelas redes sociais do IPC ressalta as diferenças de atletas paralímpicos de forma pejorativa, e vai na contramão do que a entidade nacional entende por inclusão de pessoas com deficiência na sociedade.
“Acreditamos que é possível tratar deste tema sensível com humor, leveza, emoção e descontração, sem recorrer a práticas capacitistas, pejorativas ou ofensivas aos atletas (…) É preciso compreender que as pessoas com deficiência não suportam mais abordagens preconceituosas e discriminatórias, brincadeiras sem graça e, principalmente, a relativização de suas potencialidades”, diz o comunicado (leia a íntegra abaixo).
A preocupação da organização está centrada, principalmente, nos comentários agressivos que parte do público faz nestes conteúdos, muitas vezes fazendo piada com as deficiências dos atletas. Mesmo seguindo outra estratégia de conteúdo em suas redes sociais, o CPB afirmou que também lida constantemente com comentários pejorativos em suas postagens. A organização compartilhou com o g1 parte de um documento oficial que exemplifica o problema.
Print de parte de um relatório do CPB mostra comentários pejorativos em vídeo de atleta paralímpica.
Comitê Paralímpico Brasileiro/Cedido ao g1
Questionado sobre o posicionamento do Comitê Brasileiro, o Comitê Paralímpico Internacional afirmou que a conta usa humor para celebrar os atletas e que, com ela, está conseguindo aumentar o interesse no esporte paraolímpico e em questões de diversidade e inclusão.
“O feedback da maior parte dos atletas tem sido extremamente positivo, com muitos repostando os vídeos em seus próprios canais pessoais. Quando tentamos atrair e envolver um público global, aceitamos que nem todos gostem do conteúdo. Às vezes não acertamos, mas a equipe está sempre disposta a ouvir e aprender com o feedback”, diz parte da nota oficial.
A organização também afirmou que ter uma pessoa com deficiência à frente da produção dos conteúdos garante que os vídeos sejam autênticos.
Em entrevista ao g1, Jonas Oliveira, Head de Conteúdo do IPC, afirmou que, até a publicação desta reportagem, o comitê não tinha recebido nenhuma uma queixa formal do CPB ou de outras organizações nacionais sobre o tipo de conteúdo produzido.
🏀O que dizem os atletas
Segundo o porta-voz do IPC, os conteúdos não passam por uma aprovação dos atletas antes de serem publicados, mas ainda assim houve poucos pedidos de remoção de vídeo. A organização não disponibilizou um registro formal destes casos.
“Estes vídeos curtos autodepreciativos são, de alguma forma, uma tendência nas redes sociais. Quando o IPC postou o vídeo da minha queda nas Paralimpíadas em Tóquio, também achei um pouco engraçado. No entanto, não entendi por que a postagem idêntica foi publicada novamente nas plataformas anos depois, como se fosse nova”, contou ao g1 Mareike Miller, jogadora alemã de basquete em cadeira de rodas que teve sua imagem usada no perfil do IPC.
No vídeo em questão, Miller faz uma cesta de 3 pontos e, em seguida, o conteúdo corta para um outro momento do jogo no qual a bola enrosca em sua cadeira de rodas, fazendo com que ela sofra uma queda. O áudio de fundo é um meme que viralizou em países de língua inglesa com a música Crank That, do rapper Soulja Boy.
Vídeo mostra atleta alemã do basquete de cadeira de rodas fazendo uma cesta e, em seguida, sofrendo uma queda.
Reprodução/TikTok
Para a atleta, o comitê internacional tem um trabalho educacional contra a discriminação de pessoas com deficiência que é modelo para outras entidades. Mas ela questiona se é apropriado que uma organização oficial publique vídeos nos quais os atletas podem ser vistos como “desastrados”.
“Há uma linha tênue entre ser engraçado e fazer piadas inapropriadas. Este é um tópico sensível , que envolve diferentes perspectivas e opiniões. Por essa razão, acho que seria apropriado e desejável em qualquer caso que os atletas retratados fossem consultados com antecedência sobre as publicações”, disse.
Já Martin Perry, atleta de tênis de mesa da seleção paralímpica da Grã-Bretanha, acredita que a campanha nas redes sociais do IPC derruba barreiras em torno das deficiências e dá destaque ao esporte paralímpico.
“Eu adoro o humor dos conteúdos. Como atletas paralímpicos, nós fazemos piadas sobre a deficiência uns dos outros porque é o que amigos fazem, independentemente da deficiência”, disse ao g1.
Competidora de atletismo que vai defender o Brasil nas Paralimpíadas de Paris, Verônica Hipólito também apoia a estratégia do IPC, mas critica a interação depreciativa de parte dos usuários das redes sociais.
“São comentários extremamente capacitistas, comentários sem noção nenhuma. Infelizmente eles acontecem em qualquer tipo de conteúdo que tenha uma pessoa com deficiência, e chega a dar tristeza, raiva, porque são feitos por pessoas sem deficiência”, disse.
Jonas Oliveira, o representante do IPC ouvido pelo g1, afirmou que a moderação de comentários ofensivos é um desafio que cresce conforme os vídeos viralizam em diferentes países. Mas que a organização está em diálogo constante com as plataformas de redes sociais e também com o Conselho de Atletas Paralímpicos para pensar em maneiras de mitigar o problema.
🦽 Humor X capacitismo
De acordo com o Ministério da Cidadania, capacitismo é o preconceito e a discriminação que a pessoa com deficiência vive na sociedade por ter sua existência relacionada à incapacidade ou inferioridade. São exemplos de atitudes capacitistas:
expressões inadequadas;
olhares de julgamento;
invasão de privacidade;
e ausência de pessoas com deficiência em diversos espaços.
Em entrevista ao g1, Júlia Drezza, consultora do Instituto Mais Diversidade, afirmou que, embora o Brasil tenha uma lei voltada a pessoas com deficiência desde 2015, o país ainda caminha a passos lentos em relação à inclusão.
“Nesse cenário, as brincadeiras, as piadinhas, elas muitas vezes servem como uma forma de proteção. É comum observarmos uma pessoa com deficiência dizendo ‘eu não ligo, não é relevante’. Mas será que de fato não é relevante, ou é um comportamento que nós pessoas com deficiência temos para sermos aceitos? Porque era a única forma da gente ser notado, a única forma possível de viralizar algo nós fizemos?”, disse.
Para a especialista, páginas de grande alcance, como as redes sociais do IPC, têm uma responsabilidade com a causa PCD e precisam zelar pelos conteúdos produzidos.
“Se eu sei que meu conteúdo pode gerar algum impacto negativo, e eu me coloco como uma pessoa aliada, simplesmente não vou repetir aquilo. Estamos falando do TikTok, onde há milhares de pessoas, é óbvio que isso vai chegar em diferentes públicos, com diferentes graus de maturidade, com diferentes níveis de conhecimento sobre o assunto”, explica Júlia.
“O humor é uma ótima ferramenta. Mas o humor precisa não só ter limite, como ter responsabilidade. E não dá para a gente escolher um ou outro. A gente precisa trabalhar isso de uma forma conjunta”.
💬 Nota dos comitês
Confira abaixo a íntegra da nota oficial enviada ao g1 pelo Comitê Paralímpico Brasileiro e a resposta do Comitê Paralímpico Internacional:
Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB)
“O Comitê Paralímpico Brasileiro prioriza conteúdos em que as pessoas com deficiência sejam protagonistas, destacando suas potencialidades em vez de suas diferenças. Nossa abordagem visa sempre aumentar a consciência da população sobre a inclusão dessas pessoas na sociedade.
Conceitualmente, a inclusão pressupõe a essência do indivíduo como o ponto central, sendo suas limitações físicas, intelectuais ou sensoriais apenas um detalhe. Este tipo de campanha, portanto, vai na contramão do que entendemos por inclusão, ressaltando as diferenças, e, principalmente, de forma pejorativa.
Acreditamos que é possível tratar deste tema sensível com humor, leveza, emoção e descontração, sem recorrer a práticas capacitistas, pejorativas ou ofensivas aos atletas e demais pessoas envolvidas direta ou indiretamente. É preciso compreender que as pessoas com deficiência não suportam mais abordagens preconceituosas e discriminatórias, brincadeiras sem graça e, principalmente, a relativização de suas potencialidades.
Observamos que certos comportamentos podem parecer desconectadas das realidades enfrentadas pelas pessoas com deficiência fora de contextos específicos. Essa desconexão pode inadvertidamente reforçar discursos preconceituosos e hostis, especialmente em um momento em que se busca respeito e equidade de oportunidades para essas pessoas.
Em uma de nossas transmissões de eventos para crianças com deficiência em idade escolar, por exemplo, já enfrentamos uma torrente de comentários agressivos, a ponto de mães pedirem, nos comentários, que os usuários cessassem as ofensas a seus filhos. Por todas essas razões lamentamos e nos opomos a abordagens que priorizam o aumento de audiência a qualquer custo, especialmente quando isso é feito de forma desrespeitosa e prejudicial.”
Comitê Paralímpico Internacional (IPC)
“Ninguém entende melhor a deficiência do que uma pessoa com deficiência, e ter um paraolímpico como o principal produtor da conta garantiu um conteúdo autêntico, relacionável e divertido, alcançando novos públicos.
O TikTok é diferente de qualquer outro canal digital. Para atrair o público mais jovem, precisávamos nos afastar do conteúdo esportivo tradicional que criamos para nossos outros canais sociais.
Nosso objetivo com o conteúdo do TikTok que criamos é mostrar as habilidades esportivas fantásticas e as conquistas dos paraolímpicos, destacar questões que são específicas e únicas do esporte paraolímpico e mostrar que – como em qualquer outro esporte – erros acontecem de vez em quando.
A conta é uma mistura de celebração e humor e está provocando discussão e interesse no esporte paraolímpico e em questões de deficiência ao redor do mundo.
O feedback da maioria da comunidade de atletas tem sido extremamente positivo, com muitos repostando os clipes em seus próprios canais pessoais.
Quando tentamos atrair e envolver um público global, aceitamos que nem todos gostem do conteúdo. Às vezes, não acertamos sempre, mas a equipe está sempre disposta a ouvir e aprender com o feedback.
Desde que a conta foi lançada em 2020, houve mais de 1,8 bilhão de visualizações de vídeos, enquanto a conta agora tem mais de 4,2 milhões de seguidores. Hoje, @Paralympics é uma das contas de TikTok mais populares e amplamente engajadas no esporte mundial. A conta está engajando positivamente com fãs mais jovens sobre o poder do esporte paraolímpico como uma ferramenta para impulsionar a inclusão social.
Os Jogos Paraolímpicos de Paris 2024 são a maior plataforma do mundo para colocar as pessoas com deficiência em destaque. Temos grandes planos para os Jogos Paraolímpicos e estamos ansiosos para trazer à vida nossos planos com o TikTok nas próximas semanas e meses.”
Mundo
Com discurso contra imigração, extrema direita faz campanha na Alemanha usando 'santinho' em forma de bilhete de deportação
Polícia abriu investigação para apurar incitação ao ódio. AfD, que aparece em segundo lugar nas pesquisas, confirmou distribuição dos folhetos. AfD distribuiu folhetos em formato de passagem aérea sinalizando deportação de imigrantes
Reprodução/X
A polícia alemã anunciou que abriu uma investigação após o partido de extrema direita AfD distribuir folhetos de campanha em forma de “bilhetes de deportação” para imigrantes, no âmbito da campanha para as eleições legislativas de fevereiro. Os folhetos imitam passagens aéreas.
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A investigação foi aberta após “suspeitas de incitação ao ódio”, disse um porta-voz policial da cidade de Karlsruhe, no oeste da Alemanha, onde os folhetos foram distribuídos.
A seção do Alternativa para a Alemanha (AfD) em Karlsruhe confirmou em seu site a criação do “bilhete de deportação”.
No documento vem escrito “passagem de ida em classe econômica” para um “imigrante ilegal” saindo da Alemanha com destino a um “país de origem seguro”.
O embarque ocorre na porta “AfD” no dia 23 de fevereiro, data das eleições, das “8h às 18h”, horário de funcionamento das seções eleitorais.
No verso do bilhete, a AfD defende, entre outras coisas, a “expulsão de todas as pessoas obrigadas a deixar o território” alemão.
O folheto oferece à AfD “a oportunidade de comunicar aos eleitores essas demandas completamente legítimas e de acordo com a lei de uma maneira simplificada”, justificou a seção local.
Esse material de propaganda eleitoral “está sendo distribuído atualmente em Karlsruhe da maior forma possível e sem requisitos ou restrições particulares”, acrescentou.
Algumas pessoas viram no horário de fechamento, 18h, um código neonazista baseado nas iniciais de Adolf Hitler, já que A e H são as letras 1 e 8 do alfabeto (1=A e 8=H). A seção local do partido rejeitou as acusações.
Um usuário da rede social X que se apresenta como “cidadão alemão de origem turca” afirmou que recebeu o folheto em sua caixa de correio e que teve um “sentimento muito estranho”.
“Meu sobrenome provavelmente foi determinante para essa ação”, acrescentou.
O partido de esquerda radical Die Linke qualificou a iniciativa de “método fascista para incitar o ódio” e acusou a AfD de se dirigir a pessoas de origem imigrante.
As pesquisas colocam o partido de extrema direita na segunda colocação para o pleito de fevereiro.
A AfD incluiu em seu programa eleitoral a polêmica noção de “remigração”, que prevê a realização de campanhas de expulsão de estrangeiros.
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Cachorra 'superdotada'? A border collie brasileira que sabe 200 palavras e virou estrela de pesquisa
Uma border collie de 6 anos, Gaia faz parte de um pequeno grupo internacional de cachorros com uma habilidade excepcional para aprender palavras. Gaia tem mais de 200 brinquedos e sabe o nome de cada um deles
Arquivo pessoal
Quem entra no apartamento dos brasileiros Isabella Ruiz e Raphael Ballet, em Londres, vê logo uma cesta repleta de brinquedos.
São da Gaia, uma border collie de 6 anos que também emigrou do Brasil para o Reino Unido.
A quantidade de brinquedos — 215 quando esta reportagem foi escrita — chama atenção, mas o que impressiona mesmo é que Gaia conhece cada um deles pelo nome.
Ela tem um dom raro. Gaia faz parte de um pequeno grupo, apelidado por pesquisadores de “cães gênios”, com um talento excepcional para aprender nomes de objetos — uma habilidade cognitiva que separa seres humanos de outros animais.
Até agora, apenas 41 cachorros no mundo foram identificados com essa habilidade, segundo um grupo de pesquisa da Universidade Eötvös Loránd, em Budapeste (Hungria).
Isso não é a mesma coisa que aprender comandos relacionados a ações, como pedidos para sentar ou deitar, por exemplo, como ocorre no adestramento, explicam os pesquisadores.
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Gaia é capaz de buscar os brinquedos em outros cômodos, um a um, quando um adulto pede, sem dicas gestuais dos humanos.
E tem mais: o que mais impressionou Isabella, Raphael, os pesquisadores e a equipe da BBC News Brasil foi a capacidade de selecionar o brinquedo solicitado por um processo de exclusão.
Quer dizer, se você colocar um novo brinquedo (cujo nome ela ainda não conhece) entre os objetos já conhecidos, Gaia é capaz de buscá-lo após ser pedido pelo nome que ela nunca tinha ouvido antes.
Essas habilidades foram testadas e relatadas pelos pesquisadores nos últimos anos — e a BBC News Brasil foi ver de perto.
A seguir, conheça a trajetória de Gaia, como ela foi descoberta por um grupo de pesquisa na Europa, e o que os estudos sobre o tema conseguem explicar sobre esse talento até agora.
Cachorro é flagrado ‘cantando’ em show do cantor Alceu Valença
‘Filhote com muita energia’
Gaia chegou à casa de Isabella e Raphael com dois meses e muita disposição para brincar, contam eles.
“Era um filhote com muita energia, e isso deixou a gente um pouco assustado”, lembra Isabella.
Na época, o casal morava em São Paulo e decidiu buscar ajuda de uma adestradora para criar uma rotina de atividades para Gaia, que incluía brincadeiras de esconder objetos para a cachorra encontrar.
Com menos de um ano, Gaia sabia identificar os nomes de três brinquedos, o que chamou a atenção da adestradora Carolina Jardim, que tem 15 anos de experiência na área.
“Até mesmo para um border collie, que é uma raça com muita disposição para aprender, ela mostrou uma facilidade fora do comum de memória”, diz Carolina, que também é mestranda em Psicologia Experimental na Universidade de São Paulo (USP).
Apesar de ter se surpreendido, naquele momento a adestradora ainda não sabia que Gaia tinha uma habilidade tão rara.
Mas o desempenho de Gaia foi marcante.
Em março de 2020, quando Gaia tinha cerca de 2 anos, Carolina soube do estudo em que pesquisadores estrangeiros buscavam cachorros com um talento fora do comum para identificar nome de brinquedos.
“Quando eu soube da pesquisa, na hora lembrei da Gaia e falei com os tutores: é a cara de vocês, acho que a Gaia tem potencial”, conta à BBC News Brasil.
Isabella e Raphael entraram em contato com o grupo de pesquisadores do departamento de Etologia da universidade de Eötvös Loránd, na Hungria, que pediu ao casal para fazer um teste caseiro com a Gaia.
Para integrar a pesquisa, era necessário que a cachorra soubesse um número mínimo de brinquedos, e em condições controladas, sem interferência de Isabella, de Raphael ou de adestradores.
Era uma regra, por exemplo, que os brinquedos deveriam ser colocados fora do campo de visão dos humanos e de Gaia.
O resultado surpreendeu Isabella e o marido.
“A gente colocou uns 20 brinquedos no corredor de casa e foi pedindo para ela buscar. E ela foi trazendo, um por um. A gente ficou muito impressionado que ela sabia tantos nomes, porque a gente nunca tentou ensinar”, conta.
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Raphael, Gaia e Isabella durante viagem para Edimburgo, na Escócia
Arquivo pessoal
No mesmo ano, a pesquisadora Claudia Fugazza, PhD em Etologia que lidera o projeto, visitou Gaia no Brasil para realizar alguns testes pessoalmente.
Além do teste padrão, Fugazza desafiou Gaia a encontrar os brinquedos no escuro e a identificar brinquedos cujo nome ela nunca tinha escutado.
Fugazza disse que, por mais que pesquisasse esse talento em cachorros e já tivesse conhecido naquele momento outros dois cães com essa habilidade, ela ficou impressionada com Gaia.
“Foi incrível vê-la em ação e o quão rápido ela aprendia. Fiquei particularmente surpresa quando vi como ela excluía objetos que já conhecia ao ouvir o nome de um brinquedo desconhecido”, conta.
Brinquedo novo
A seleção de brinquedos por meio do processo de exclusão também surpreendeu a equipe da BBC News Brasil, que reproduziu o experimento quando visitou o apartamento de Isabella e Raphael.
Para fazer o teste, a BBC levou um brinquedo que Gaia não conhecia e deu o nome de “pirulito”.
Sem que Gaia visse, o objeto foi colocado no meio de outros 10 brinquedos conhecidos por ela, em um corredor do apartamento.
Da sala, Isabella pediu, primeiro, que Gaia pegasse um brinquedo que ela já conhecia — para eliminar a possibilidade de Gaia ir diretamente no objeto desconhecido simplesmente por ser uma novidade.
Em seguida, ela pediu para Gaia pegar o “pirulito” — brinquedo que a cachorra nunca tinha visto ou escutado o nome.
Ao ouvir a nova palavra, Gaia foi até o cômodo ao lado e voltou com o pirulito, o brinquedo novo.
“É uma habilidade cognitiva impressionante porque os seres humanos também fazem isso. Se você colocar vários objetos juntos e pedir a uma criança para pegar um objeto cujo nome ela nunca ouviu antes, ela é capaz de raciocinar por exclusão e pegar o objeto novo”, explica Fugazza à BBC News Brasil.
“Eles inferem que, como aquele brinquedo novo é o único desconhecido, e os outros têm um nome que eles já conhecem, o novo é aquele ao qual você está se referindo.”
Gaia conseguiu identificar o brinquedo novo, chamado de pirulito, por um processo de exclusão
João da Mata/BBC
Memória por dois anos
Quando a pesquisa começou, em 2018, Fugazza diz que o objetivo era estudar como os cães entendiam o que os seres humanos falavam.
Segundo ela, o grupo não sabia que existiam animais capazes de reconhecer palavras de objetos — até conhecer um cachorro que já possuía essa habilidade linguística.
“Aquilo me intrigou muito, porque a linguagem por meio de palavras é uma característica do ser humano. Mas a gente pensou: se tem um, pode ter mais. E começamos a procurar.”
Gaia entrou oficialmente para a pesquisa em 2020 e foi a primeira cachorra brasileira a ser identificada como gifted word learner dog (em português, um cachorro com talento de aprender palavras).
Até então, havia cinco cachorros de outros países já certificados com esse talento.
Naquele momento, segundo Fugazza, os pesquisadores tinham uma dificuldade muito grande em tornar o estudo conhecido e encontrar mais cachorros com essa habilidade.
Então, durante a pandemia, eles criaram um desafio internacional de cães gênios, com a participação dos seis cachorros, incluindo a Gaia.
A brincadeira consistia em duas fases: na primeira, os cachorros tinham que aprender 6 objetos em uma semana.
Na segunda fase, eram 12 brinquedos em uma semana.
A disputa foi transmitida ao vivo pelo canal do YouTube “Genius Dog Challenge”.
Gaia gabaritou nos dois desafios, acertando todos os objetos.
Gaia é certificada por universidade em Budapeste como uma cachorra com talento para aprender palavras
João da Mata/BBC
O mais surpreendente, contudo, de acordo com a pesquisadora, foi perceber que, dois anos após o desafio, os cachorros ainda lembravam do nome de objetos com os quais perderam o contato.
“Pedimos aos donos de cachorros para esconder os brinquedos por dois anos para fazer um teste de memória. E ficamos impressionados em ver que a maioria dos cachorros lembrava de uma grande parte dos objetos”, conta.
Quando esse teste de memória foi feito com Gaia, ela lembrou de nove de 12 brinquedos.
Como ensinar palavras a um cachorro?
A pergunta que Isabella e Raphael mais recebem nas redes sociais, em um perfil onde compartilham a rotina da Gaia, é: Como eles ensinaram o nome dos brinquedos?
“A gente não ensinou, ela aprendeu brincando”, diz Isabella.
Estudos realizados pela Universidade de Eötvös Loránd indicam que, segundo o que se sabe até agora, a habilidade de aprender palavras não pode ser ensinada. O que é possível é que um cachorro que já tem essa habilidade aprenda novas palavras.
“No início da pesquisa, eu estava convencida de que era possível ensinar ao menos alguns nomes. Mas falhamos em todas as vezes que tentamos”, afirma Fugazza.
Em um dos experimentos, o grupo de pesquisadores selecionou 39 cachorros de diferentes raças (19 adultos e 15 filhotes) para ensinar nomes de brinquedos.
Eles passaram dois meses com sessões de brincadeiras que envolviam esses objetos, reproduzindo o que os donos de cachorros com essas habilidades contaram que faziam.
No fim do período, apenas um cachorro havia aprendido o nome de brinquedos.
“Parece ser um dom, que ou o cachorro tem ou não”, diz a pesquisadora.
Por que alguns cachorros conseguem e outros não?
Uma das questões que mais intriga os pesquisadores — e o público — é: por que alguns cachorros têm essa habilidade e outros não?
“A gente ainda não tem essa resposta. Pode estar associado a um conjunto de fatores. Pode ser um fator genético, pode ser do ambiente em que eles vivem, ou pode ter relação a uma exposição desde muito novos a várias palavras enquanto brincavam. Essas são algumas hipóteses”, diz Fugazza.
“A única coisa que a gente sabe é que eles não aprenderam de forma sistemática, por meio de treinamento, mas de forma espontânea”.
A pesquisadora diz que a maioria dos donos de cachorros que participam do projeto são como Isabella e Raphael: pessoas comuns, com uma “vida normal”, sem especialização em técnicas de adestramento.
“No geral, eles não sabem dizer como os cachorros aprenderam as palavras, porque eles nunca tiveram a intenção de ensinar. Mas a percepção deles é que os cachorros têm muito mais disposição para brincar do que outros cachorros”, afirma.
Apesar de mais da metade dos cachorros da pesquisa serem border collies — dos 41 cachorros, 23 são desta raça — Fugazza lembra que a maioria dos border collies não têm essa habilidade de aprender palavras
“Eu tenho um border collie e ele não sabe nenhuma palavra”, diz, rindo. “Além disso, há cachorros de outras raças na pesquisa, como shitzu, além de vira-latas”.
Além dos 23 border collies entre os 41 cães identificados pela pesquisa, há também outros quatro cachorros que são misturas com border collie, três labradores, dois lulu-da-pomerânia, além de nove cachorros de outras raças ou vira-lata.
Os cachorros foram encontrados em 9 países: Estados Unidos, Reino Unido, Brasil, Canadá, Noruega, Hungria, Holanda, Portugal e Espanha.
É adestramento?
Fugazza destaca que a habilidade dos cães para aprender palavras é diferente da capacidade de aprender comandos e ações, o que a maioria dos cachorros consegue aprender por meio de treinamento.
“Para aprender nomes de ações, os cães usam os princípios de aprendizagem por condicionamento, formando associações. Na presença de um determinado estímulo, como o som de ‘senta’ ou ‘deita’, eles produzem um comportamento específico, que gera uma recompensa. Esse é um mecanismo de aprendizagem amplamente difundido e que não está relacionado à linguagem”, explica.
“Já no aprendizado de palavras, estamos falando de uma habilidade cognitiva de linguística, algo que pertence à espécie humana, mas que esses animais, de alguma forma, aprenderam em atividades do dia a dia, brincando.”
Ainda não se sabe quais mecanismos esses cachorros usam no processo de aprendizagem e se, de alguma forma, se assemelham ao usado por crianças para aprender palavras.
No entanto, segundo Fugazza, os estudos realizados indicam que os cães usam diversos sentidos para reconhecer os objetos.
“Em experimentos que fizemos no escuro, observamos que eles são mais devagar para pegar objetos, o que indica que eles usam principalmente a visão. Mas foi interessante ver que, na ausência de luz, durante as buscas por brinquedos, eles usam outras habilidades sensoriais como olfato e tato”, destaca.
À BBC News Brasil, Claudia Fugazza diz que os pesquisadores ainda buscam entender o que explica a rara aptidão de alguns cachorros de aprender o nome de objetos
João da Mata/BBC
Como saber se meu cachorro é ‘superdotado’?
Se um cachorro sabe os nomes de três ou quatro objetos, é possível que ele seja “superdotado” e consiga aprender novas palavras quando exposto a outros brinquedos, segundo Fugazza.
“Até onde a gente sabe, se um cachorro sabe três ou quatro nomes, é fácil para ele conseguir ampliar seu vocabulário para 50 ou 100. O mínimo para fazer o teste são dois”, afirma.
Esse número pode parecer pouco, mas a pesquisadora explica que, por mais esperto que um cachorro seja, poucos são realmente capazes de desenvolver habilidades de linguagem.
“Muitos donos pensam que seus cachorros sabem os nomes de objetos porque eles são muito bons em ler nossa linguagem corporal. Mas, quando você pede a um cachorro para pegar uma bola, você normalmente está dando uma dica visual ou fazendo uma movimentação com o seu corpo que indica o que você quer ou onde o objeto está. Então, o cachorro pega a bola não porque ele sabe a palavra, mas diante do contexto”, afirma Fugazza.
Por isso, para verificar se um cachorro tem ou não uma habilidade relacionada à linguagem, os pesquisadores realizam testes em condições controladas, em que o cachorro precisa identificar os objetos sem qualquer tipo de dica, como foi feito com a Gaia.
“A gente coloca vários brinquedos espalhados em um cômodo diferente daquele que o tutor e o cachorro estão. Assim, quando o tutor pede para que o cachorro busque um determinado brinquedo, ele não tem como ajudar por meio de um contato visual que direcione o cachorro. O cachorro precisa ir até o outro cômodo sozinho e resolver esse problema, apoiando-se puramente na palavra que ouviu”, explica a pesquisadora.
Gaia foi a primeira cachorra brasileira a fazer parte da pesquisa que investiga a habilidade de cachorros para aprender nomes de objetos
João da Mata/BBC
Quantas palavras um cachorro ‘superdotado’ consegue aprender?
O número de palavras que um cão pode aprender varia, dizem os pesquisadores.
Os cachorros identificados pela universidade em Budapeste sabem entre 200 e 400 nomes de brinquedos. Mas há registros na literatura de um cachorro que aprendeu mais de mil palavras.
“Quanto mais brinquedos ele tiver, mais nomes ele vai saber. A gente não sabe se existe um limite”, afirma Fugazza.
“Os estudos mostram que eles precisam ouvir apenas quatro vezes o nome de um novo objeto para aprendê-lo. E isso leva questões de minutos, o que é impressionante.”
Embora apenas 41 cachorros com essa habilidade tenham sido encontrados ao redor do mundo, os pesquisadores acreditam que existem mais e divulgam informações na página do projeto.
“Temos pouco acesso a países cuja língua oficial não seja o inglês, e a gente acredita que, por isso, existam muitos cachorros com essa habilidade que ainda não foram descobertos”, diz Fugazza, ressaltando a contribuição desses cães para a ciência.
“Além de ser incrível ver as habilidades que esses cachorros têm, estudá-los pode nos ajudar a entender como a linguagem em seres humanos evoluiu.”
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Irã e Rússia anunciam acordo que inclui áreas de defesa e segurança
O ‘Acordo Global de Associação Estratégica’ prevê “cooperação nas áreas de energia, meio ambiente e questões de defesa e segurança”, detalhou embaixada iraniana. Anúncio foi feito pelo Kremlin nesta segunda-feira (13). Vladimir Putin, presidente da Rússia
Reuters/Maxim Shemetov
A Rússia e o Irã assinarão um “Acordo Global de Associação Estratégica” na sexta-feira (17), durante a visita do presidente iraniano, Massoud Pezeshkian, à Rússia, anunciou o Kremlin nesta segunda-feira (13).
Rússia e Irã estão sob duras sanções ocidentais e estabeleceram laços estreitos em vários setores, inclusive o militar.
O acordo abrange “a cooperação econômica e comercial nas áreas de energia, meio ambiente e questões de defesa e segurança”, disse a embaixada iraniana na Rússia na semana passada via Telegram.
No ano passado, Moscou concluiu um tratado de mesmo nome com a Coreia do Norte. Um dos artigos do acordo, ratificado pelos deputados russos em outubro, prevê “assistência militar imediata” em caso de agressão armada por terceiros países.
As potências ocidentais veem isso como um risco de intensificação do conflito entre Rússia e Ucrânia, que começou há quase três anos.
Kiev e várias potências ocidentais acusam a Coreia do Norte de enviar soldados para lutar com o exército russo contra as forças ucranianas. Moscou e Pyongyang não confirmaram nem negaram essas acusações.
Masoud Pezeshkian, presidente do Irã
REUTERS/Mike Segar
O Ocidente também acusa Teerã de fornecer drones explosivos Shahed e mísseis de curto alcance para a Rússia. O Irã rejeita essas acusações.
Pezeshkian e Putin se encontraram pela última vez em outubro, durante a cúpula do Brics em Kazan, sudoeste da Rússia. Na ocasião, o presidente russo falou sobre uma visita iminente de seu colega iraniano para assinar este acordo de associação, segundo o Kremlin.
Em outubro, Putin elogiou os laços “amigáveis” entre Teerã e Moscou e pediu a consolidação da “dinâmica positiva” de sua cooperação econômica.
A Rússia quer desenvolver um corredor logístico, ferroviário e marítimo entre Moscou, Baku, capital do Azerbaijão, e Teerã.
Irã e Rússia também eram aliados do ex-presidente sírio Bashar al-Assad, que foi deposto em 8 de dezembro por uma coalizão de rebeldes dominada por islamistas.
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